sábado, março 12

A maldição de Pereira

Hoje é um daqueles raros dias de sol no Porto. Tão raro que imaginem o que seria dos portuenses se estivessem dependentes do sol para serem felizes. Há tempos, um estudo - um daqueles estudos, sabem? - garantia que as pessoas mais felizes vivem no Porto -, algo que me fez pensar que se assim é, é porque os portuenses não olham muito ao material e sabem que a felicidade é um conceito interior e não exterior. Ou então tinham o futebol para os fazer felizes. Mas em anos de interrupção de vitórias - e tantas que elas foram - tudo se pode dizer acerca do FC Porto. Há até quem garanta, em castelhano (que é uma língua muito ligado ao insucesso portista das últimas épocas...) que há mais benfiquistas do que portistas na Invicta. Realmente, só faltava esta para juntar a tudo o que já se disse nesta época.

Mas, irredutivelmente, ao portista não lhe interessa isso das grandiosidades. Se lhe interessasse... era benfiquista. O que interessa ao portista é ir ganhando. E se for com menos, melhor. Que é para sublinhar que as grandes conquistas também se fazem com poucos, e que essas, sim, são as grandes conquistas. Contudo, se a falta de sol não chateia muito, a falta de vitórias e de atestado moral de superioridade, chateia e de que maneira. A máxima não ganharás sempre - da qual Jesus se devia ter lembrado no último dérbi lisboeta - não é conhecida para estes lados. Mas, a pouco e pouco, afinal, os portistas vão sendo lembrados que são de carne e osso. Hoje já não acreditam que ganham com qualquer um aos comandos da equipa - mais a mais quando é o Benfica que parece que ganha com qualquer um  - e isso reflecte-se no medo cénico que, antes e na sua inexistência, os fazia ter aquele killer-instinct que faz as bolas entrarem na baliza do adversário, enquanto impede as bolas de baterem no cordame azul-e-branco. Como os tempos mudam, hã?

É que, hoje por hoje, ou se tem um excelente maestro, e uma orquestra afinada, ou os tiros nos pés dos adversários não contam para nada. E, neste campeonato que vai acabar com pontuações abaixo das do último tri portista, o FC Porto fez tudo ao contrário. E, ao que parece, mesmo que fizesse tudo bem (manter Lopetegui? despedi-lo? reduzir a massa salarial em janeiro? reforçar-se bem? contratar Conceição? contratar Peseiro? contratar Zé Quinta? contratar Luís Campos?), já não ia a tempo de evitar as consequências de actos passados, onde a sobranceria foi tão grande que a omnipotente estrutura reclamou para si os louros das últimas conquistas. Ora se reclamou para si os louros, que reclame agora também as consequências. E se no que toca às contas à moda do Porto, pouco posso opinar (sou de letras, porra, e por isso só desconfio), interessa frisar que esse modelo de gestão, no fio-da-navalha, se transportou para o campo. Décadas e décadas a acertar no treinador? Décadas e décadas a ganhar seis, sete, em dez? Alguém acredita nisto? Alguém acredita que não haja aqui insucesso dos adversários? incompetência? falta de visão?

Hoje já se sabe que eles não andam a dormir. E ainda bem. Porque o Porto que emerge da derrota é mais forte que o anterior. Assim como o Benfica que emergiu da derrota é mais forte que aquele que se arrastava há ainda não muito tempo. Assim como o Sporting, espero (saiba manter o timoneiro e deixá-lo trabalhar) ficará mais forte com os meses e anos de trabalho jesuíta. Hoje, talvez por isso, se fale muito no ranking uefeiro. Afinal de contas a vitória do Benfica, na Rússia, garantiu três equipas portuguesas na Champions de 2017/18. Um favor benfiquista, retribuído aos muitos favores portistas ao longo das últimas décadas, mas no qual o Braga também tem uma palavra a dizer. Agora imaginem o que seria uma Liga a trabalhar para si mesma, tendo a Europa como mira e não a lata que se festeja no Marquês ou na Alameda.

Mas, lembrar o Braga, é lembrar a infantil caminhada deste FC Porto altruísta que distribui brindes por todos e mais alguns. Um habito festivo que começou com o actual treinador dos minhotos, o mesmo que agora é levado num andor nas coagitações para treinar outro grande. Vale aos portistas a palavra outro, pois já estão fartos de saber o que a casa gasta. E olhando para o Fenerbahçe-Braga, como para qualquer jogo-grande que o Braga tenha realizado esta época (se exceptuarmos o recuo benfiquista depois do... 0-2), se percebe porque Paulo Fonseca terá que mudar muito para ser um técnico capaz de desafios maiores. O facto de só assumir um jogo, daquela natureza, se o deixarem, por si só já devia ser um atestado ao grande que o quisesse contratar, mas na retina ficam os resultados e a boa organização. É boa, não duvidem, mas lembra-me uma tirada do candidato a candidato republicano Marco Rubio sobre o candidato a candidato democrata Bernie Sanders: não me levem a mal, eu até acho que Sanders seria um óptimo presidente... da Suécia! Mas nós não somos a Suécia, somos os EUA... 

De facto, só Paulo Fonseca - que estimo imenso por ser alguém que consegue chegar-se à frente na Liga com equipas medianas - me faria usar um exemplo de um republicano para validar um argumento. Mas, de novo, olhando para o Fenerbahçe-Braga e para a disposição de uma e de outra equipa, se denota o porquê de um ter sido bicampeão no FC Porto e o outro ter saído pela porta-dos-fundos. E Fonseca, e o seu Braga até podiam ter ganho - melhor seria para o ranking - que essa suposta vitória (que ainda pode acontecer na Pedreira) em nada me faria mudar de opinião. A ganhar o Braga ganhará a jogar no erro, incapaz de comandar o jogo, de se esticar totalmente no terreno e gerir-lhe os ritmos, ser protagonista. O Fenerbahçe, apostará sempre nisso tudo e saberá defender com poucos. Já o Braga faz tudo para não se expôr e, venenosamente, aproveitar uma ou duas falhas adversárias. O que é legítimo, bem legítimo, mas que não funciona num grande. Ou alguém se lembra de um campeão assim? 

18 comentários:

HY disse...

O Benfica do Mortimore, ou do Trapatoni...?

Marco Morais disse...

Dou de barato a do Trap - ainda que pense que não era uma equipa super-defensiva (também o Braga não é) - e do Mortimore não me posso lembrar. Ainda assim, (só) dois campeões em tanto tempo não invalida a teoria =)

Abraço!

RedAtheist disse...

Quando o JJ saiu para o Sporting era Vitor Pereira que eu queria para o meu clube.Um Treinador que em 2 anos na Liga perdeu 1 jogo tem um registo impressionavel.PS: #Feel the Berne 2016.

Ace-XXI disse...

Não sei se JJ continuará em Alvalade mas caso saia Vitor Pereira seria um excelente sucessor.

LDP disse...

eu duvido que qualquer um dos grandes, hoje, tivesse ido a casa do Fenerbahce tentar mandar no jogo. Sendo uma primeira mão de uma eliminatória, repito, fora de casa.

Nestes jogos a táctica adoptada é sempre na condição de 180 minutos a serem jogados e, considerando também que lugar se ocupa no campeonato interno e qual o próximo adversário.

Penso que, no lugar do braga, o Benfica não quereria ter mandado neste jogo. O Porto, mesmo que quisesse não o teria conseguido. e o sporting teria talvez tentado mas sem grande sucesso.

O Fener é forte. Assim de momento lembro-me de Topal, Kajer, Van Persie, Markovic, Nani, Demirel...

Marco Morais disse...

Red Atheist, embora o exemplo não o sugira, estou pelo Bernie também =)

Ace, Vítor Pereira seria uma excelente opção para qualquer um dos grandes e acredito que treinasse qualquer um deles.

LDP, concordo porque dizes hoje. E tens razão, na actualidade nenhum quereria, nem, se quisesse, o conseguiria. O que sei é que o Porto do VP iria lá para mandar no jogo.

Markovic e Diego não jogaram. Nani e Fernandão entraram. No meio-campo penso que estão fracos e a defesa também não me parece grande espingarda. Não os achei melhores que Porto e Benfica de 2013 e lembro-me de pensar que este Sporting (sem rotatividade) seria bem capaz de limpar a eliminatória (mas isto foi só um feeling). O Benfica, depois do que fez em S Petersburgo também teria, obviamente, as suas chances. Mas a agressividade dos turcos, e o balanceamento da equipa de VP é muito superior à do Zenit.

Quer isto dizer que o Braga não pode ganhar? Não, não quer. Quer é isto dizer que VP é o treinador português que, pela maneira com que aborda o jogo, mais me agrada.

LDP disse...

Marco atenção, nao falei em chances de limpar a eliminatória. Esse teria sido um comentário mais abrangente.

Mencionei apenas o "mandar no jogo". E esta eliminatória terá ainda o jogo em braga.

Como sabes, uma equipa pode ganhar (e até mesmo limpar uma eliminatória) sem mandar no jogo. Penso que o Benfica em S. Peterburgo é um claro exemplo. Foi um Benfica parecido ao de Alvalade, não mandou mas controlou o adversário (umas vezes mais á distância, outras a menos). Em alvalade marcou no primeiro terço do jogo, na Rússia entrou em vantagem.
Em alvalade guardou o resultado e na Rússia, depois de um golo ilegal, foi lá á frente repôr a certeza de quem era a equipa mais forte em campo (não confundir com jogadores mais fortes). E em alvalade não precisou de o fazer porque, não só foi protegida e embalada pelo árbitro, como estacionou um camião de duplo atrelado á frente da baliza.
Talvez se tivessemos um treinador a opção tivesse sido por um atrelado só. Mas nunca o saberemos :)

E já agora, depois de o ter feito também em alvalade(depois do porto na Luz), na Rússia lá marcámos mais dois golos provenientes de cruzamentos. Que raio de estilo de jogo, hã? :)

Marco Morais disse...

Eu percebi, LDP :)

Essa dos cruzamentos há-de me perseguir... Mas eu fiz por isso! No entanto mantenho que a recuperação do Benfica se deve não só à taxa de sucesso nos cruzamentos como ao aproveitamento monstruoso da 1a chance de golo.

Se quiseres mando-te um artigo que escrevi sobre Jonas (e Slimani) que revela algo sobre isso. Mas concordo que o Benfica é hoje mais que isso -aquela subida depois do golo sofrido na Rússia impressionou-me e prova-o. Uma atitude muito parecida à atitude mandona com que o SLB entra nos jogos.

RedAtheist disse...

Eu sei que isto e um blog de futebol e nao de politica mas goatava de dizer umas palavras sobre politica.O comentario de Marco Rubio ate e engrancado mas apesar se ele nao ser dos piores,os Republicanos sao "batshit crazy".Portugal teve em Paulo Morais o seu Bernie mas como em Portugal ganhouno voto simpatia,Paulo Morais nem deu luta,ate o Tino de Rans teve mais votos que ele,o que me deixa muito preocupado para o futuro.

Marco Morais disse...

Já falámos de música, porque não poderemos falar de política? Isto apesar de eu ser tudo menos um especialista na matéria. Por exemplo, de Paulo Morais conheço o nome (que não é mau, já agora!) e a música de campanha (o meu vizinho deixa a TV muito alta). Não acompanhei umas eleições decididas à partida pela força mediática do vencedor e pela fraca qualidade do contingente de esquerda. Li umas entrevistas mas nenhuma foi de Paulo Morais, pelo que não o posso comparar com o Sanders.

Sobre o 'velhote', encanta-me a força de um discurso que quer sair dos padrões americanos. Apesar dos democráticos serem, muitas vezes, um golpe de vista, Bernie parece capaz de abanar a máquina. Se a vai mudar? Isso não sabemos. Mas, lembro, não sou um especialista e acompanho as eleições americanas como acompanho os Oscars: pelo espectáculo.

Sobre os republicanos, tudo dito.

Pedro disse...

Do que conheço do Paulo Morais a comparação com Bernie é pouco elogiosa para o americano. Do que me falam do "velhinho" ele é uma lufada de ar fresco na política americana. Coisa que Paulo Morais nunca foi na nossa. Fala muito da corrupção mas apenas e só. Sim, tem um belo papel de não deixar o assunto morrer nos média mas para PR seria preciso mais (no meu entender, não no sentido real de ser mesmo preciso...bolas tivemos uma mumia durante 10 anos).

Marco Morais disse...

Tu, Pedro, votavas Trump ou Frank Underwood, que eu sei!

Ricardo disse...

Cada vez mais se confirma a ideia de que Villas-Boas no Porto se mexia por cordéis orientados por Vítor Pereira. Por mim, avançava já para a sua contratação não estivesse, como se parece estar, já contratado o Marco Silva. É, com Mourinho e Jesus, um membro do melhor trio de treinadores portugueses.

Marco Morais disse...

Parece-me um pouco exagerado (isso do VP fazer a papa toda ao AVB) mas já andei mais longe de acreditar nessa teoria. Contudo inclino-me mais para o resultadismo (que também afectou Mourinho).

Abraço!

Ace-XXI disse...

Marco silva para o porto ou para o benfica Ricardo?

Ricardo disse...

Marco,inicialmente também me custou acreditar mas os anos têm demonstrado que a qualidade de um e de outro são bem distintas. Este Zenit, para os jogadores que tem, joga muito pouco. Abraço!

Ace,nem para um nem para outro. Para o Benfica.

Pedro disse...

Trump? Eu?
Nunca. Provavelmente Bernie.

Mas, admito, está-me a dar algum gozo tudo isto do Trump. :)

Pedro disse...

Underwood Rules!! :)