terça-feira, dezembro 20

Auto-regulação

O Kovacevic tem uma expressão bastante feliz sobre o que se está a passar no Vit. Setubal: o futebol auto-regula-se. Não posso deixar de concordar. Hoje em dia ninguém joga por amor à camisola. O equilíbrio de forças entre Clubes e Jogadores está claramente favorável aos jogadores e de tal maneira que, enquanto estes forem dominando este equilíbrio de forças, continuaremos a assistir a fenómenos como os que tocam ao Vitória de Setubal hoje, ao Farense ontem e a qualquer outro amanhã.

Num País como o nosso no qual cerca de 80% das pessoas que gostam de futebol são adeptas de 3 clubes (e 95% são adeptas de 6 ou7), o mercado potencial dos restantes clubes é exíguo. Insustentável para os salários de um clube médio ou pequeno em PORTUGAL. Alguém me consegue explicar como pode um Clube que tem uma média de assistências de 5 000 espectadores nos jogos em casa, conseguir pagar ordenados médios por jogador de 5 000 euros por mês? Mesmo somando receitas de publicidade e de TV a conclusão é óbvia e as consequências também.

Enquanto todos os clubes continuarem alegremente e de mão dada a funcionar com esta lógica de pagar salários insustentáveis, sob o argumento de não perderem competitividade face aos outros clubes, os jogadores não saem prejudicados enquanto os clubes com menos capacidade financeira serão os primeiros a sentir as consequências. Mas o mercado auto-regula-se. O dinheiro não cresce nas árvores e mesmo ganhando Taças de Portugal, o dinheiro não aparece.

As soluções para se dar o salto qualitativo são também conhecidas:

1) aposta na formação, valorização dos jogadores para vender, etc etc. Mas alguém pode censurar um clube por preferir apostar num brasileiro de 26 anos, muito mais barato que um jogador de idêntica qualidade português e certamente com mais experiência e capacidade de ajudar a equipa do que um miudo de 18 anos proveniente das escolas? Existe uma discrepância no futebol em termos de prazos: as políticas dos clubes são de médio/longo prazo mas os resultados medem-se no curto prazo, jogo a jogo ou época a época. Assim sendo, a aposta em jogadores de mercados mais acessíveis em vez de apostar na formação é uma consequência “imposta” pelo funcionamento da indústria.

2) Uma solução alternativa é a redução do nº de clubes, nunca para 16 clubes (que apenas vai agudizar o problema porque perde-se receitas de bilheteira de 2 jornadas), mas para 12 clubes. A probabilidade de haver outros clubes a lutar pelo título ou a aceder à Liga dos Campeões aumenta. A competitividade do campeonato também - ficam apenas as 12 melhores equipas. Mas curiosamente, e como diz e bem o Kovacevic, são os próprios Clubes, os pequenos e miseráveis, a vetar soluções deste tipo. Preferem continuar na senda da mediocridade, sujeitos a acontecer-lhes qualquer dia o mesmo que acontece agora ao Vitória de Setubal.

P.S. Pensar que numa lógica de funcionamento como a actual, uma melhor gestão resolve os problemas é utopia. A mecânica do sistema atrofia e impede qualquer solução suportada por boas decisões de gestão. No máximo, uma gestão cuidadosa e muita sorte apenas adia o inevitável.

P.P.S. Então porque é que ainda não fecharam as portas mais clubes? Porque como se sabe os patrocinadores privados e mecenas, empresas locais ou governos regionais continuam a dar a mama e a impedir o descalabro.

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