quinta-feira, agosto 30

Pecado (na) Capital fez vítima blaugrana

Quando há algo de verdadeiramente especial nem todos o conseguimos ver. Talvez seja esse o facto que me faça desconfiar de maiorias ou de manifestações. Ontem o Real de Mourinho ganhou de novo ao Barça e a multidão apressa-se, desde já, a fazer vítimas e a condenar a superioridade de um sobre o outro. Coisas passageiras diria. Diria mesmo mais, passageiras e dependentes de uma fase. Se fossemos capazes de ver 'o filme todo' com certeza repararíamos que foi essa 'certeza' e essa vontade de estagnar que fizeram o Barça cair em Camp Nou.

Não foi atípico pela vitória do Real. É que nesta guerra, que já dura há várias batalhas, a equipa de Mourinho tem certos trunfos que nunca desprezaria numa final decidida a duas mãos. A habitual pressão alta e a determinação quase sobre-humana nas divididas não apareceu em Camp Nou, logo teria de estar guardada para o Bernabéu. Uma semana antes, na Catalunha, os merengues raramente passaram do meio-campo, sendo assim a presa ideal para um Barça que já ganhou tudo enquanto perde motivos para se continuar a transcender. Ontem achou que o Real iria ser dócil - mesmo depois de Tito Vilanova avisar na antevisão - e acabou por ser presa fácil para a pressão, para a dividida e para o ambiente blanco.

De nada serve explicar com a ausência de Dani Alves, com a expulsão de Adriano e com a inclusão de um canterano inexperiente. O Barcelona caiu do céu quando julgou pelo que o seu adversário fez e não pelo mais difícil que poderia encontrar. Quando julgamos por aparência (o Real em Camp Nou foi uma aparência de si próprio) normalmente enganamo-nos. A equipa de Tito Vilanova não viu o 'filme todo' pois, para depois do intervalo das duas mãos, estava guardado algo que apareceu em todas as batalhas: a transcendência do Real.

É que a hegemonia do Barcelona não foi conquistada à sombra da bananeira. Houve vontade de encontrar o maior desafio em todos os jogos e passar por cima dele. Daí se explicam tantas vitórias sobre o maior rival, e quando o conforto surgiu (depois de um início de época alarmante para o Real) os blaugrana cederam à pressão de Chamartín e estiveram mesmo à beira de ceder um resultado histórico. Valeu Valdés, o mal amado da primeira mão.

Claro que quando as pilhas acabaram, já com o Barcelona reduzido a dez, a posse e a circulação voltaram. Mas mais do que isso voltou a real vontade de estar no campo, a tal que evita erros infantis como o de Mascherano e o de Piquè nos dois golos blancos. Assim, depois de estar à beira de um resultado humilhante, uma equipa com menos um jogador consegue marcar antes do final da primeira-parte e criar, depois na segunda, três oportunidades claras de golo (contra uma do Real por intermédio de Khedira). Dava para passar, mas elas não entraram por acaso. É que o pecado capital já estava cometido.

Esse é o mesmo que todas as equipas que estão por cima estão mais perto de cometer. O conforto e a falta de vontade para transcender estão à espreita. O Barcelona foi vítima dele, tal o relaxamento com que entrou na partida, e agora a batata-quente passa para os de Mourinho. Que usem luvas, pois a temperatura não perdoa.

P.S. A não-relação entre Messi e Ronaldo é das coisas mais escabrosas a que me lembro de assistir. Dois jovens, no auge das suas carreiras, dos mais bem-pagos do Mundo, os dois com números fabulosos no que diz respeito a troféus, golos e assistências, passam um pelo outro e não conseguem celebrar o espectacular momento que vivem. Naquele momento mereciam os dois uma enorme vaia. Durante o jogo, ainda vá. Fora dele, deviam ser um exemplo para uma rivalidade saudável. Assim só dão azo a que isso continue a fazer escola...

6 comentários:

Pedro disse...

O modelo de jogo do Barça permite que mesmo com 10, fazendo recuar o Messi para junto de Xavi e Iniesta, todo o jogo da equipa se mantêm.

Circulação e posse á procura do espaço. Jogar com 10 ou 11 é igual (não é igual pq deixa de ser Messi a receber a bola lá na frente com tudo o que isso representa) e o mais impressionante é que com menos um o Barça fazia pressão em cima da defesa do Real quando este queria sair com a bola.

Isto é fabuloso.

A malta que acha q o Barça joga feio e maçador devia ser presa.

Posto isto, adorei a tromba do Piquê no golo do Ronaldo e mais um para o currículo do Mourinho. Não é um catedrático mas é, inequivocamente, o Special One ou Único como ele prefere.

Marco Morais disse...

Não é bem igual mas disfarça bem. Mourinho também já conseguiu isso quando treinava o Porto e, depois, o Chelsea.

Se formos ver bem, é só menos um. Palavras dele.

Pena o discurso ter mudado depois de ter ficado tanta vez reduzido a dez contra o Barcelona. Hehe!

Apaixonantes estes duelos.

Mike Portugal disse...

De facto a não-relação entre Ronaldo e Messi é idiota. Rivalidade dentro de campo, sim. Quando o jogo acaba deviam dar o exemplo.

Quanto ao jogo e mesmo quando o Barça estava com 11 já o Real podia estar a ganhar 3-0 não fosse o desperdício de Higuain.

Jorge Borges disse...

Do jogo não falo porque não vi.

Só quero deixar bem sublinhado que concordo letra por letra com o teu último parágrafo. Quando é que se vai perceber que o futebol deve ser uma festa? Rivalidade sim, mas apenas durante o jogo. Esta gente e esta mentalidade mata o futebol.

luissm disse...

Não estarão a ser injustos nisso da não-relaçaõ CR7-Messi?
As imagens mostram que quando foram cumprimentar o árbitro não se falaram, mas isso não impede que o tenham feito antes...

Marco Morais disse...

luismm,

Pode ter acontecido, é verdade. No entanto, aquela tensão toda no rosto dos dois não me parece saudável.

São livres de se expressarem como quiserem, também não quero que os obriguem a dar-se bem um com o outro. Só acho descabido, porque não tem razão de ser. Um dia vão olhar para trás e ver que os melhores momentos da vida dos dois estarão marcados por uma rivalidade infantil.