Custa-me a acreditar que já passaram mais de 20 anos desde que, pela primeira vez, vi jogar um miúdo loiro - com risca ao lado, roupa branca sem marca e um aspecto que em tudo indicava o “all american kid” -, nos Internacionais de Itália. Com o passar dos anos, crescemos ambos, com trajectórias irregulares e alguns assomos de loucura. Para ele foi o cabelo comprido, o equipamento cor-de-rosa berrante, os romances com actrizes famosas ou a derrota na final de Roland Garros, frente a Andreas Gomez, em 1990. O tempo trouxe-lhe, também, dificuldades imprevistas, momentos de depressão e decadência precoce, que quase o afastaram do ténis.
Ainda assim, numa altura em que o seu nome estava prestes a desaparecer da lista dos 200 primeiros, decidiu recomeçar. Acompanhado por um novo treinador – que foi, mais do que isso, um amigo -, abdicou de todas as vantagens de que usufruiu para chegar ao topo da primeira vez e batalhou, no funesto circuito “Challenger”, por cada ponto do “ranking”, por cada lugar na tabela. Contra tudo e a opinião de todos, venceu em Wimbledon, na Austrália e, claro, no “seu” US Open”, alcançando o estatuto de número um do Mundo.
Com – que não contra - Pete Sampras, por quem nunca escondeu enorme admiração, manteve uma das mais extraordinárias rivalidades da história do desporto, entusiasmando e inspirando gerações.
Em 1999, à beira de completar 30 anos, preparou-se para participar, uma vez mais, em Roland Garros, o único “Grand Slam” que lhe faltava e que estava certo de não poder ganhar, depois da oportunidade perdida há quase uma década. Numa final épica – com muito vento, a qualidade do ténis praticado não foi brilhante, mas a recuperação encetada à força de espírito e talento fica na memória de quem assistiu -, fechou um ciclo, tornando-se no primeiro tenista desde Rod Laver – há 40 anos - a levantar o troféu dos quatro maiores torneios.
Com lugar garantido na história do ténis, podia ter preferido afastar-se mas, surpreendendo uma vez mais quem dele duvidou, preferiu tentar a sua sorte contra as novas gerações de super-atletas. Até aos 36 anos, deu tudo o que tinha para dar, tornando-se numa das mais respeitadas figuras da modalidade que ajudou a revolucionar. Hoje, é uma lenda que dedica a sua vida à família e a ajudar quem precisa. O miúdo rebelde transformou-se num homem invulgar, até mesmo – o que o teria chocado - num “gentleman”.
Ontem, assistindo à partida que marca a sua despedida, vi a maior demonstração pública de respeito, admiração e afecto que se pode dedicar a um desportista. Batido por um jovem alemão, castigado por horríveis dores que suporta há anos, Andre Agassi perdeu o seu último jogo, mas foi um gigante na hora do adeus. Eu, certamente, não esquecerei os fabulosos momentos que me proporcionou.
Acrescento apenas algumas notas.
Os americanos, com todos os defeitos que os caracterizam, insistem em ensinar-nos a todos como homenagear quem merece, mostrando que só somos pequenos porque queremos.
A extraordinária conferência de imprensa de Andre Agassi, que decorreu após a sua derrota, lembra-me o quanto os jornalistas portugueses – entre os quais me incluo – deveriam evoluir, enquanto o comportamento, a disponibilidade, a franqueza, o sentido de humor e a inteligência do inesquecível tenista deviam servir de lição aos atletas que temos por cá.
E daí, talvez não… É que a “grandeza” não se ensina…
Sem comentários:
Enviar um comentário